
Um alerta
amarelo de risco de erupção do vulcão Cumbre Vieja emitido nesta
quinta-feira (16) reacendeu a discussão de possibilidade de formação de
tsunamis que poderiam atingir a costa brasileira. No entanto,
especialistas em geociências e sismologia ouvidos pelo G1 afirmam que a
chance do desastre acontecer é remota.
Localizado
na ilha de La Palma, nas Ilhas Canárias, próximo à costa do continente
africano, o vulcão, que estava adormecido há décadas, deu sinais de
atividades sísmicas.
O alerta
emitido pelo governo espanhol indica que não há certeza de abalos, mas
que o cuidado se estende para os próximos dias ou semanas.
O
Instituto Geográfico Nacional da Espanha detectou 4.222 tremores no
parque nacional Cumbre Vieja, em volta do vulcão. Nos últimos dias, além
de aumentar o volume de movimentos sísmicos, a intensidade aumentou com
abalos que tiveram magnitude superior a 3.
Segundo o
pesquisador Saulo Vital, professor do Departamento de Geociências da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e Coordenador do Núcleo de
Estudos e Ações em Urgências e Desastres (NEUD), não existem estudos
aprofundados com simulações numéricas sobre os impactos para a costa
brasileira, então seria difícil especificar com clareza quais estados
seriam afetados por um possível tsunami.
Porém,
devido ao formato da costa brasileira, a proximidade do Nordeste com as
Antilhas torna a região mais vulnerável, principalmente o litoral
setentrional, formado por Ceará, Rio Grande do Norte e nordeste do
Maranhão.
Alerta não é preocupação para o Brasil
O
professor e pesquisador Saulo Vital explica que existem quatro níveis de
alerta, o amarelo é o segundo nível, que trata-se, na verdade, de um
estado de observação por causa dos pequenos sismos dos últimos dias. O
pesquisador afirma que o alerta é importante, mas não é dos mais graves.
Segundo
ele, o que poderia causar uma tsunami seria uma erupção explosiva, ou
seja, o desmoronamento de parte do vulcão. Isso porque, de acordo com
ele, os sismos que costumam ocorrer na área do Cumbre Vieja são
moderados, e o que pode gerar tsunamis são abalos sísmicos de alta
intensidade.
Caso haja
uma erupção capaz de desestabilizar a estrutura rochosa do vulcão,
causando um desmoronamento, essa queda iria gerar um movimento de massas
d’água. Esse movimento criaria altas ondas, que atingiriam toda a costa
do Atlântico.
O
coordenador do Laboratório Sismológico da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, Aderson Nascimento, explica que nenhum alerta foi feito
ao órgão.
“Essa
chance é muito pequena de acontecer. A gente como órgão de sismologia,
ninguém soube de nenhum alerta que foi emitido pelo serviço geológico
espanhol ou algum órgão oficial dizendo que isso está acontecendo”.
Ele
compartilha a opinião do pesquisador paraibano e afirma que não há
motivos para preocupação com um desastre tão grande no Brasil.
“A gente
não tem essa preocupação no Brasil, porque esse evento é muito pouco
provável”, diz. “Agora, eu não estou dizendo que a chance é zero de
acontecer, eu estou dizendo que é muito baixa”.
Falta de plano de contingência é preocupação
Apesar dos
alertas não demonstrarem riscos iminentes, a ausência de plano de
contingência preocupa os especialistas em desastres. A preparação para
lidar com fenômenos naturais que resultam em grandes estragos é uma das
agendas desses pesquisadores, que reafirmam as problemáticas do Brasil
nesse sentido.
Para o
pesquisador Saulo Vital, acreditar que as chances são baixas é
importante para não gerar alarde, mas assumir que, quando se trata de
natureza, o imprevisível é possível deve ser um motivo para que o poder
público se atente a preparar as cidades e proteger a população.
“Não há,
por exemplo, um plano de contingência para fenômenos assim em João
Pessoa, assim como várias outras cidades, é necessário que haja essa
preparação para reduzir os danos”, explica.
Pesquisa levantou a possibilidade de tsunami
A pesquisa mais conhecida sobre o fenômeno
foi publicada pelo pesquisador Mauro Gustavo Reese Filho, da
Universidade Federal do Paraná.
O trabalho
observou que o Oceano Atlântico não é famoso pela sua capacidade de
gerar tsunamis, mas que o vulcão ativo Cumbre Vieja poderia ser o agente
responsável por um evento desta natureza na região.
Segundo o
pesquisador, “uma próxima erupção poderia desestabilizar a encosta da
ilha e gerar um tsunami que percorreria distâncias transatlânticas, que
atingiria praticamente todos os países banhados pelo Oceano Atlântico”,
atesta no estudo.
Apesar do
risco, pesquisas publicadas no exterior indicam que casos como esse são
raros e nunca foram registrados na história. A distância entre João
Pessoa e a Ilha de Palmas é de 6.309,41 quilômetros.
Tsunami na costa do Brasil em 1755
Uma
pesquisa da Universidade Estadual do Rio de Janeiro encontrou evidências
da chegada de um tsunami em praias da costa brasileira em 1755, como
resultado de um terremoto que atingiu Lisboa. A onda gigante atravessou o
Atlântico e causou estragos na costa brasileira. O estudo foi liderado
pelo professor Francisco Dourado, do Centro de Pesquisas e Estudos sobre
Desastres.
Ao todo,
foram 270 quilômetros de trabalho de campo em 22 praias entre Rio Grande
do Norte e o sul de Pernambuco, com quatro pontos de coleta de
amostras. Mas a onda gigante atingiu toda a costa nordestina, com
relatos de ter chegado também ao Rio de Janeiro, no sudeste do País.
“No
material coletado, a gente vê elementos químicos que não eram pra ser
encontrados ali. Eram pra ser encontrados em regiões com mais
profundidade. Ou seja, algo trouxe aqueles elementos até ali. Da mesma
forma, há vestígios de microanimais que não deveriam ser encontrados na
praia”, afirmou o pesquisador à UERJ na época da pesquisa.
Na região
da praia de Lucena, na Paraíba, as ondas variaram entre 1,8 e 1,7 m de
altura. Na região de Pitimbu, no mesmo estado, a altura das ondas ficou
entre 1,5 e 1,1 m; na região pernambucana de Tamandaré, variou entre 1,9
e 1,8 m. As ondas não chegaram muito altas, mas o volume de água foi
grande.
As ondas
inundaram até 4 quilômetros distantes da linha de costa, principalmente
em locais com influência de rios, nas proximidades da Ilha de Itamaracá
(PE). Em Tamandaré a inundação foi de até 800 metros. Já em Lucena foi
de aproximadamente 300 metros.